O modelo de locação de imóveis por curta temporada, impulsionado por plataformas digitais como o Airbnb e o Booking, vive um momento de forte questionamento ao redor do mundo. Depois de restrições impostas em cidades como Nova York, Barcelona, Paris e Berlim, agora o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) também firmou posição contrária ao uso de imóveis residenciais para hospedagens de curta duração, com multa de R$ 5 mil a R$ 50 mil em casos de infração.
A decisão, proferida pela juíza Ana Carolina Avellar Diniz no dia 6 de agosto (Processo n°: 0099896-76.2023.8.17.2001), determinou que condomínios podem impedir esse tipo de locação quando a convenção condominial estabelece uso exclusivamente residencial.
Essa decisão se insere num contexto regional, com restrições a esse tipo de hospedagem na Paraíba (especificamente na orla de João Pessoa), Bahia, Ceará, Sergipe e Alagoas.
A magistrada reforçou que não é necessária cláusula expressa de proibição para vedar a prática, uma vez que hospedagens de curta duração descaracterizam a finalidade habitacional, aumentam a circulação de estranhos e geram riscos à segurança e ao sossego dos moradores.
Segundo o advogado Amadeu Mendonça, especialista em negócios imobiliários, a decisão representa um ponto de atenção para proprietários que veem na locação de curta temporada uma alternativa mais rentável em relação ao aluguel tradicional.
“As locações de curtíssima duração têm sido tema recorrente de discussões. De um lado, moradores alegam que esse modelo aumenta a insegurança, de outro, investidores defendem sua legalidade. Em alguns países, tendência seguida também pelo Brasil, esse tipo de locação vem sendo equiparado à hotelaria, o que tem trazido determinadas restrições. O fato é que, no Brasil, a prática é lícita, mas depende de autorização expressa na convenção de condomínio”, avalia Mendonça.
Senado avalia restrições com o Novo Código Civil
A decisão do judiciário pernambucano está em consonância com o Poder Legislativo, haja visto que o Projeto de Lei 4/2025, em tramitação atualmente no Senado, propõe uma atualização da Lei nº 10.406/2002, que altera o Código Civil e traz restrições mais duras para as plataformas de aluguel.
Caso a nova lei seja aprovada, a locação só poderá ocorrer se estiver autorizada expressamente na convenção do condomínio. Atualmente, o aluguel por temporada no Brasil é regulado pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991).
Os prós e contras das locações de curta temporada
Entre as vantagens do modelo estão a rentabilidade superior ao aluguel convencional, a flexibilidade para o proprietário e a dinamização do turismo local. Em contrapartida, os principais pontos de crítica envolvem a redução da oferta de imóveis para moradores, o aumento no preço dos aluguéis de longo prazo e o impacto na qualidade de vida em comunidades residenciais, devido à alta rotatividade de hóspedes.
Movimento global
A decisão do TJPE acompanha uma tendência mundial de maior regulação sobre plataformas de hospedagem. Em Nova York (EUA), desde setembro de 2023, uma lei municipal proibiu a locação de apartamentos inteiros por menos de 30 dias sem a presença do proprietário, praticamente inviabilizando o Airbnb na cidade. Já em Barcelona (Espanha), a prefeitura anunciou que eliminará todas as licenças de aluguel de curto prazo até 2028, com o objetivo de devolver milhares de unidades ao mercado habitacional.
Outros exemplos vêm de Berlim (Alemanha), onde locações de apartamentos inteiros dependem de autorização específica e podem gerar multas elevadas, e de Paris (França), que limita em até 120 dias por ano a locação de imóveis em plataformas digitais. Em Florença (Itália), novas licenças estão proibidas no centro histórico, numa tentativa de conter o chamado “over tourism” e preservar a identidade local.
Impactos no Brasil
Para Amadeu Mendonça, a decisão do TJPE pode abrir caminho para novas interpretações semelhantes em outros estados brasileiros, fortalecendo a posição dos condomínios. “Esse julgamento mostra que o Brasil acompanha a tendência internacional de equilibrar os interesses do turismo e da livre iniciativa com a preservação da moradia, da segurança e da convivência comunitária. O grande desafio é encontrar um ponto de equilíbrio, que permita ao proprietário rentabilizar seu imóvel sem prejudicar os interesses dos demais moradores”, reforça o advogado.
Esse cenário impacta particularmente as capitais do Nordeste, região com perfil de turismo de sol e mar e de negócios.
A plataforma de inteligência de mercado AirDNA (Denver, Colorado/EUA) – líder mundial de análise de dados no segmento – registra, em setembro de 2025, 43,6 mil anúncios ativos no Airbnb e aplicativos concorrentes, nas 9 capitais da região, boa parte deles referentes a imóveis residenciais.
Em primeiro lugar, nesse levantamento, aparece Salvador (13.262 ofertas), seguida por João Pessoa (9.016), Fortaleza (5.875), Maceió (5.567), Recife (4.704), Natal (3.303), Aracaju (2.655), São Luís (1.569) e Teresina (480).
Tendência global de restrição
A decisão do TJPE se soma a uma série de medidas regulatórias em diversas cidades do mundo:
● Nova York (EUA) – desde 2023, proíbe a locação de apartamentos inteiros por menos de 30 dias sem a presença do proprietário.
● Barcelona (Espanha) – eliminará todas as licenças de curto prazo até 2028 para devolver 10 mil imóveis ao mercado habitacional.
● Paris (França) – limita em até 120 dias por ano a locação em plataformas digitais.
● Berlim (Alemanha) – exige autorização especial para locar apartamentos inteiros, sob risco de multas elevadas.
● Florença (Itália) – proíbe novas licenças no centro histórico para conter o turismo excessivo.